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01.07.2013

A nova Lei da Concorrência de Moçambique

Introdução

O passado dia 11 de Abril constituiu um marco importante para a economia moçambicana, com a publicação da Lei n.º 10/2013, que estabelece o regime jurídico da concorrência em Moçambique e institui a Autoridade Reguladora da Concorrência (“ARC”), que será responsável pela sua aplicação.

A nova lei, que se inspira nas legislações em vigor em Portugal e na generalidade dos países europeus (as quais, por seu turno, colhem inspiração do direito da União Europeia), vem na sequência dos esforços desenvolvidos nos últimos anos pelo Governo moçambicano para dinamizar a iniciativa económica e liberalizar alguns sectores-chave, como os das telecomunicações, portos, caminhos-de-ferro e serviços financeiros.

Moçambique torna-se assim o primeiro país africano de expressão portuguesa a estar dotado de um moderno sistema de promoção e defesa da concorrência.


Autoridade Reguladora da Concorrência

A ARC será uma autoridade independente, dotada de autonomia administrativa e financeira, com amplos poderes de supervisão, regulamentação, investigação e sancionatórios, no âmbito dos quais poderá fazer inquirições, solicitar documentos e proceder a buscas e apreensões e à selagem das instalações. Prevê-se uma articulação estreita entre a ARC e as restantes autoridades reguladoras sectoriais.

A ARC poderá atribuir graus de prioridade diferentes no tratamento das questões (ao abrigo do designado “princípio da oportunidade”, recentemente introduzido em Portugal), devendo publicitar no último trimestre de cada ano as prioridades da política de concorrência para o ano seguinte.


Práticas Proibidas

A nova lei tem um vasto âmbito de aplicação, na medida em que é aplicável tanto a empresas privadas como a empresas públicas, e abrange todas as actividades económicas exercidas no território moçambicano ou que nele produzam efeitos, embora admita algumas derrogações.

A exemplo dos direitos europeu e nacional, são proibidos os acordos e práticas restritivos da concorrência, tanto entre empresas concorrentes (as chamadas práticas “horizontais”, cujo exemplo mais grave é o dos chamados cartéis), bem como os acordos entre empresas e os seus fornecedores ou clientes, no âmbito de relações “verticais”.

São igualmente proibidas as condutas abusivas praticadas por empresas em posição dominante (incluindo, entre outras, a recusa de acesso a infra-estruturas essenciais e a ruptura injustificada de relação comercial), bem como a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, do estado de dependência económica em que se encontrem os seus fornecedores ou clientes.

A Lei prevê, em todo o caso, que as práticas proibidas poderão ser justificadas se resultarem em eficiências económicas, bem como se promoverem a competitividade das pequenas e médias empresas ou a consolidação do empresariado nacional (desde que não eliminem a concorrência e sejam indispensáveis para o objectivo a realizar).


Controlo de Concentrações

A nova lei introduz o controlo prévio de concentrações em Moçambique. Todas as operações de concentração que preencham os critérios de quota de mercado ou de volume de negócios/facturação anual, ainda a determinar pelo Conselho de Ministros, passarão a estar sujeitas a comunicação prévia obrigatória à ARC, no prazo de 7 dias úteis após a conclusão do acordo ou do projecto, e não poderão ser implementadas antes de aprovadas. A validade dos negócios jurídicos realizados depende da autorização expressa ou tácita da ARC.

As concentrações sujeitas a comunicação prévia (bem como outras sobre as quais a ARC decida solicitar informações) deverão ser proibidas se forem susceptíveis de criar ou reforçar uma posição dominante da qual possam resultar entraves significativos à concorrência efectiva nos mercados relevantes.


Pesadas sanções

A violação das proibições constantes da nova lei sujeita as empresas infractoras a multas que podem atingir até 5% do volume de negócios de cada empresa no ano anterior. Por outro lado, a falta de comunicação prévia de concentrações no prazo legal e a não colaboração com a ARC constituem infracções puníveis com multa até 1% do volume de negócios anual.

A lei prevê ainda sanções pecuniárias compulsórias, quando tal se justifique, bem como ainda sanções acessórias potencialmente muito graves, pois não só o infractor poderá ver-se excluído de participar em concursos públicos durante cinco anos, como poderá até ver-se confrontado com o possível desmembramento da empresa infractora. Por fim, os acordos e práticas celebrados em violação da lei são nulos.


Comentário

A lei entrará em vigor no próximo dia 10 de Julho, e deverá ser regulamentada (incluindo, entre outros, a aprovação dos Estatutos da ARC) até ao dia 8 de Outubro.

A aplicação prática da Lei dependerá em larga medida da organização e funcionamento da ARC, e das prioridades que esta vier definir para a sua actuação. Se a ARC seguir o exemplo da generalidade das autoridades europeias, entre os processos prioritários estarão os cartéis, os acordos de distribuição com fixação de preços de revenda, os abusos de exclusão de concorrentes por empresas dominantes, e a implementação de um sistema de controlo de concentrações eficaz.

Tal como reconhecido pelo próprio Governo moçambicano, a implementação da nova lei de concorrência deverá ser gradual, e entre os interesses a salvaguardar contam-se alguns que vão para além da protecção de um processo concorrencial, tais como a promoção dos produtos e serviços nacionais, a competitividade das pequenas e médias empresas e a consolidação do empresariado nacional (estes são aliás objectivos que poderão justificar acordos restritivos da concorrência).

Em todo o caso, tendo em conta os amplos poderes e as pesadas sanções ao dispor da ARC, não temos dúvidas de que todas as empresas com presença – actual ou futura – em Moçambique deverão analisar com cuidado o impacto da nova lei sobre as suas actividades, com vista a afastar o risco de as suas condutas no mercado poderem vir a ser consideradas contrárias à Lei da Concorrência.