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01.04.2016

Geo-blocking na UE – Comissão divulga conclusões preliminares

Introdução

No âmbito do inquérito sectorial sobre o comércio eletrónico, lançado pela Comissão Europeia (“Comissão”) em Maio de 2015, esta entidade publicou, muito recentemente, um conjunto de conclusões preliminares que evidenciam o recurso a práticas de geo-blocking que impedem os consumidores de livremente adquirirem ou acederem a bens de consumo e conteúdos digitais, na União Europeia (“UE”).


Geo-blocking, geo-filtering e sua incidência na UE

Entende-se por geo-blocking, para este efeito, as práticas pelas quais os fornecedores de bens/ conteúdos online impedem o acesso ou a compra desses bens/ conteúdos a utilizadores localizados num Estado-Membro diferente do fornecedor. O geo-blocking pode consistir no bloqueio de acesso a determinado websites (acessíveis apenas a utilizadores localizados no território do fornecedor), no re-routing automático para outro website destinado ao território do utilizador em questão, na impossibilidade de entrega de bens/prestação de serviços ou na recusa de pagamentos, em função da localização do utilizador. No caso de conteúdos digitais online, constitui ainda geo-blocking a limitação de acesso a conteúdos digitais subscritos noutro Estado-Membro ou a impossibilidade de acesso a conteúdos já descarregados noutro Estado-Membro, quando o utilizador em questão se desloca para um Estado-Membro diferente.

Quando o acesso a bens/conteúdos não é limitado em função da localização mas são cobrados preços ou condições de aquisição diferentes, em função do Estado-Membro de localização do utilizador, tal prática designa-se geo-filtering.

Os dados recolhidos pela Comissão relativamente ao comércio online de bens de consumo revelam que 38% dos retalhistas inquiridos procedem à recolha de informação relativa à localização dos seus utilizadores com o objetivo de efetuarem geo-blocking. A percentagem é de 43% no caso de marketplaces e de 34% no caso de ferramentas online de comparação de preços. O geo-filtering é praticado por apenas 1/4 dos inquiridos.

No que respeita aos conteúdos digitais, 68% dos inquiridos utiliza práticas de geo-blocking relativamente a utilizadores localizados noutros Estados-Membros (maioritariamente, com base na verificação do endereço IP do utilizador em questão).


Abordagem numa ótica jusconcorrencial

A Comissão distingue conforme o geo-blocking/geo-filtering sejam (i) baseados numa decisão comercial unilateral do operador em questão, de não expandir a atividade para outros Estados-membros, ou (ii) adotados em virtude de acordo entre o distribuidor/revendedor dos bens/conteúdos em questão e um terceiro (em regra, o fornecedor). Com efeito, a atuação unilateral de um operador apenas está sob a alçada do direito da concorrência se o operador em questão dispuser de uma posição dominante no mercado; já as práticas de geo-blocking/ geo-filtering consagradas em acordos ou práticas entre empresas são passíveis de proibição e sanção se se verificar, com base numa análise casuística, que as mesmas têm por objeto (ou efeito) uma restrição da concorrência e não satisfazem os requisitos legais para que possam beneficiar de uma isenção.

Os dados recolhidos indicam que a maioria das práticas de geo-blocking adotadas na revenda online de bens de consumo resulta de uma decisão unilateral do operador em questão de não vender fora do seu território, o mesmo sucedendo com o geo-filtering. Apenas 12% dos inquiridos reportaram restrições contratuais (diretas ou indiretas) à realização de vendas transfronteiriças em pelo menos uma das categoria de produtos por si vendidos. A forma mais comummente utilizada de geo-blocking nestes casos é a recusa de entrega de bens noutros Estados-Membros e a categoria de bens em que tais práticas parecem ser mais recorrentes é “vestuário, calçado e acessórios”.

Algumas das restrições contratuais levadas ao conhecimento da Comissão neste contexto – nomeadamente, limitações nos territórios de venda em sistemas de distribuição não exclusiva, limitações das vendas passivas no caso de distribuição exclusiva, limitações territoriais na venda a clientes finais por distribuidores autorizados no âmbito de um sistema de distribuição seletiva - foram sinalizadas (pela sua gravidade) como merecendo uma análise mais profunda pela Comissão, com vista a avaliar da necessidade de enforcement adicional para assegurar o respeito pelas regras de concorrência.

No caso dos conteúdos digitais, verificou-se que 59% dos inquiridos adota práticas de geo-blocking em virtude de disposições contratuais, nomeadamente, acordos licenciamento de direitos, no âmbito dos quais o geo-blocking surge como um requisito imposto pelo licenciador.

Os conteúdos cinematográficos, eventos desportivos e séries televisivas são aqueles em que se verifica, em média, ao nível da UE, um maior percentual de requisitos de geo-blocking (por comparação com outros conteúdos), embora a realidade ao nível de cada Estado-membro se apresente muito díspar. De notar a análise e as conclusões deste inquérito sectorial não abrangem a disponibilização de conteúdos cinematográficos em serviços de televisão paga, uma vez que estes são atualmente alvo de uma investigação da Comissão (por suspeita de práticas restritivas da concorrência nos relativamente aos serviços de TV paga disponíveis no Reino Unido e Irlanda).


Observações finais

As averiguações preliminares demonstram que o geo-blocking (nomeadamente, ao nível da venda on-line de bens de consumo) surge frequentemente associado a uma decisão unilateral das empresas, de não expandirem a sua atividade para outros territórios. Neste âmbito, a Comissão manifestou já ser sua prioridade a adoção de medidas legislativas destinadas a eliminar as barreiras injustificadas ao comércio transfronteiriço na UE, no âmbito da sua “Estratégia para um mercado único digital”. Prevê-se a apresentação de propostas legislativas já no próximo mês de Maio.

No que respeita à intervenção do direito da concorrência da UE para identificar e sancionar práticas de geo-blocking/ geo-filtering (restritivas da concorrência), importa ter presente que tal normativo só terá aplicação, no caso de práticas unilaterais, se as mesmas forem adotadas por empresas em posição dominante (por forma a identificar e sancionar eventuais abusos), ou relativamente ao geo-blocking/ geo-filtering assente em acordos ou práticas entre empresas. Quanto a estes, será necessário apurar, com base numa análise casuística, o objeto (ou efeito) restritivo de tais acordos ou práticas e ainda, que não estão preenchidos, no caso, os requisitos legais que permitem a sua isenção.

Por fim, admite-se que a indicação, dada pela Comissão, de que pretende levar a cabo uma análise adicional de algumas restrições territoriais mais graves já identificadas possa redundar na abertura, num futuro próximo, de processos de natureza sancionatória nesta área.

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