A agressão da Rússia à Ucrânia levou a União Europeia a reforçar a sua política de defesa, culminando no Plano Rearmar a Europa, apresentado em março de 2025, com potencial de financiamento até 800 mil milhões de euros. Este plano inclui o regulamento SAFE, que mobiliza 150 mil milhões em empréstimos para apoiar investimentos conjuntos em produtos de defesa, acelerar a produção e reforçar a indústria europeia. O SAFE estabelece regras simplificadas para contratos públicos e privilegia a participação de empresas europeias. A sua implementação aguarda aprovação pelo Conselho e o lançamento de um convite à manifestação de interesse pelos Estados-Membros.
Enquadramento
A agressão militar da Rússia contra a Ucrânia marcou o regresso dramático dos conflitos territoriais e da guerra em solo europeu. Esta mudança estrutural na segurança e defesa europeias e na geopolítica europeia levou os Estados-Membros da União Europeia (UE) a repensar os seus planos e capacidades de defesa.
Os Chefes de Estado e de Governo da UE, reunidos em Versalhes em 10 e 11 de março de 2022, comprometeram-se a “reforçar as capacidades de defesa europeias”. Estes objetivos foram reiterados nas Orientações Estratégicas de Segurança e Defesa.
A UE adotou dois instrumentos de emergência para fazer face às consequências imediatas da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, nomeadamente o regulamento que cria um instrumento para reforçar a indústria europeia da defesa através da contratação conjunta e o regulamento relativo ao apoio à produção de munições.
Em março de 2023, a Comissão Europeia e o Alto Representante da UE apresentaram também uma Estratégia Industrial Europeia de Defesa (EDIS) que salientou que os Estados-Membros da UE continuavam a comprar predominantemente de forma individual e a Estados terceiros. Esta observação foi confirmada pelo relatório sobre o futuro da competitividade europeia, da autoria do Professor Mario Draghi. A EDIS sublinhou a necessidade de os Estados-Membros gastarem mais, melhor, em conjunto e a nível europeu, para inverter as tendências negativas que afetam a Base Industrial e Tecnológica Europeia de Defesa (BITD) e reforçar efetivamente a prontidão industrial da UE na defesa.
Neste contexto, a Comissão Europeia apresentou ao Conselho Europeu, a 6 de março de 2025, o Plano Rearmar a Europa, assente em cinco pilares. O seu objetivo é dar resposta à situação de urgência, desbloqueando até 800 mil milhões de euros. Este enquadramento levou a uma proposta de regulamento do Conselho, de 19 de março de 2025, com um financiamento de 150 mil milhões de euros, destinado a mobilizar o orçamento da União para apoiar e acelerar os investimentos nacionais na defesa através de um novo instrumento financeiro da UE: o regulamento que cria a Ação pela Segurança da Europa (SAFE) através do reforço do instrumento da indústria europeia de defesa.
Principais elementos do SAFE
- O SAFE estabelece as regras relativas aos procedimentos comuns simplificados e acelerados de adjudicação de contratos para a aquisição de produtos de defesa e outros produtos para fins de defesa pertencentes às seguintes categorias:
- munições e mísseis; sistemas de artilharia; pequenos drones (classe 1 da NATO) e sistemas antidrone conexos; proteção de infraestruturas críticas; cibernética e mobilidade militar;
- defesa aérea e antimísseis; drones que não sejam pequenos drones (classes 2 e 3 da NATO) e sistemas antidrone conexos; capacitadores estratégicos; proteção de bens espaciais; inteligência artificial e guerra eletrónica.
- O SAFE presta assistência financeira aos Estados-Membros para atividades, despesas e medidas relacionadas com produtos de defesa adquiridos através de contratos públicos comuns com o objetivo de:
- acelerar, de forma colaborativa, a adaptação da indústria da defesa às mudanças estruturais, nomeadamente através da criação e do reforço das suas capacidades de produção, bem como das atividades de apoio conexas;
- melhorar a disponibilidade atempada dos produtos de defesa, nomeadamente através da redução do respetivo prazo de entrega, da reserva de faixas horárias de fabrico ou da constituição de reservas de produtos de defesa, produtos intermédios ou matérias-primas.
- A assistência financeira assume a forma de empréstimos concedidos pela União aos Estados-Membros, totalizando uma assistência financeira de 150 mil milhões de euros;
- Os Estados-Membros que pretendam receber assistência financeira ao abrigo do SAFE devem apresentar à Comissão um Plano de Investimento na Indústria Europeia de Defesa no prazo de seis meses a contar da data de entrada em vigor do SAFE;
- O SAFE prevê as condições de participação dos contratantes e subcontratantes envolvidos nas aquisições comuns. Em regra, os contratantes e subcontratantes, em causa devem estar estabelecidos e ter as suas estruturas de gestão executiva na União Europeia, nos Estados da EFTA que fazem parte do EEE ou na Ucrânia. Os contratantes de países terceiros estão sujeitos a um procedimento de seleção, a medidas atenuantes adequadas ou, se aplicável, a garantias, de acordo com um modelo normalizado disponibilizado pela Comissão;
- Para facilitar a partilha de informações confidenciais e sensíveis entre a Comissão e os Estados-Membros (e, se for caso disso, com os contratantes ou outros destinatários finais), a Comissão irá adotar um sistema seguro para o efeito.
Próximos passos
- Aprovação do regulamento SAFE pelo Conselho;
- Lançamento pela Comissão de um convite à manifestação de interesse, solicitando aos Estados-Membros interessados que apresentem, no prazo de dois meses, um objetivo para a assistência financeira solicitada, bem como um montante indicativo máximo e mínimo do empréstimo;
- Posteriormente, a Comissão notifica os Estados-Membros interessados, no prazo de duas semanas, sobre a afetação dos montantes dos empréstimos disponíveis para cada Estado-Membro.
Para além do tema abordado neste Legal Alert, a Morais Leitão continua a acompanhar de perto todos os instrumentos jurídicos relacionados com o setor da Defesa na União Europeia.