As Autoridades Europeias de Supervisão divulgaram o Relatório Final sobre as Normas Técnicas de Regulamentação vinculadas ao Regulamento DORA, que tem como objetivo aumentar a resiliência operacional digital do sector financeiro na União Europeia. Estes RTS introduzem novos requisitos rigorosos para a subcontratação de serviços de tecnologias de informação e comunicação, com especial destaque para as funções críticas. As orientações compreendem desde a avaliação dos riscos e de due diligence até a implementação de padrões contratuais e a gestão das cadeias de subcontratação. Para garantir conformidade antes de janeiro de 2025, as instituições financeiras e os seus fornecedores de TIC precisam de adaptar rapidamente as suas práticas de subcontratação.
1. Contexto
As Autoridades Europeias de Supervisão (AES) publicaram recentemente o Relatório Final relativamente aos Projetos de Normas Técnicas de Regulamentação (Regulatory Technical Standards – RTS) conforme exigido pelo Artigo 30.º, n.º5 do Regulamento (EU) 2022/2554 relativo à resiliência operacional digital do setor financeiro (Regulamento DORA).
Estes RTS estabelecem novos requisitos para as entidades financeiras no que diz respeito à subcontratação de serviços de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), especialmente quanto aos serviços que suportam funções críticas ou importantes, de forma a fortalecer a gestão de risco associado às TIC nestas situações.
De forma alinhada com o Regulamento DORA, os RTS visam reforçar a resiliência digital das entidades financeiras em toda a União Europeia (UE), visando garantir que os riscos associados à subcontratação de serviços de TIC sejam adequadamente geridos e mitigados.
2. Aspetos-chave dos RTS
2.1. Avaliação da subcontratação de TIC
O Artigo 1.º dos RTS especifica os elementos que as entidades financeiras devem considerar ao determinar (i) a dimensão, (ii) o perfil de risco, (iii) a natureza, (iv) a escala e a (v) complexidade dos seus serviços, atividades e operações. Tal inclui a avaliação de fatores como:
- O tipo de serviços de TIC que suportam funções críticas ou importantes ao abrigo do contrato celebrado entre a entidade financeira e o terceiro prestador de serviços de TIC e entre este último e os seus subcontratantes;
- A localização dos subcontratados de TIC e as suas empresas-mãe;
- A extensão e complexidade da cadeia de subcontratação;
- A natureza dos dados partilhados com os subcontratantes de TIC e se os serviços de TIC subcontratados são fornecidos dentro da UE ou em países terceiros, incluindo onde os serviços são prestados e onde os dados são objeto de tratamento e conservação;
- A identificação dos prestadores de serviço TIC intra-grupo e se se encontram registados ou supervisionados por uma autoridade competente de um Estado-Membro da EU ou de um país terceiro;
- A avaliação de concentração de serviços de TIC em um ou poucos subcontratantes;
- A capacidade de trocar de prestadores de serviço de TIC e o risco de disrupção que afetem serviços críticos de TIC ao utilizar subcontratantes.
2.2. Implementação de standards uniformes para a subcontratação intra-grupo
O Artigo 2.º dos RTS estabelece que a empresa-mãe do grupo da entidade financeira deve garantir que os standards se aplicam igualmente aos subcontratantes intra-grupo, o que significa que as entidades dentro do mesmo grupo se encontram sujeitas à mesma supervisão que os terceiros prestadores de serviço, em particular:
- As entidades financeiras devem assegurar que os prestadores de serviços de TIC intra grupo se encontram sujeitos às mesmas avaliações de risco e monitorização contínua que os terceiros prestadores de serviço;
- A empresa-mãe deve implementar práticas de subcontratação consistentes em todas as entidades do grupo, de forma a garantir uma abordagem coesa para a gestão de risco e conformidade.
2.3. Due diligence e avaliação de risco para funções críticas
De acordo com o Artigo 3.º dos RTS, as entidades financeiras devem aferir, antes de contratar um terceiro prestador de serviços de TIC, se tal prestador de serviços se encontra autorizado ou não a subcontratar total ou parcialmente quaisquer funções críticas, avaliando:
- Se o terceiro prestador de serviços de TIC implementou um processo de due diligence para verificar as capacidades operacionais e financeiras potenciais dos seus subcontratantes;
- Se o terceiro prestador de serviços de TIC tem capacidade para identificar e informar a entidade financeira sobre todos os subcontratantes envolvidos e verificar se os contratos com os mesmos permitem que a entidade financeira cumpra as obrigações legais, tais como direitos de acesso para auditorias e inspeções;
- Se o terceiro prestador de serviços de TIC tem recursos, conhecimentos técnicos e estruturas de gestão de riscos adequadas para supervisionar os serviços subcontratados e se a entidade financeira também tem os recursos e estruturas para supervisionar quer o terceiro prestador de serviços TIC como os seus subcontratantes;
- Os riscos relacionados com a localização dos subcontratantes e a concentração de serviços de TIC (incluindo os riscos de uma eventual falha).
Tal avaliação deve ser realizada periodicamente pelas entidades financeiras.
2.4. Condições para a subcontratação de serviços críticos de TIC
De acordo com o Artigo 4.º dos RTS, as entidades financeiras devem definir claramente quais os serviços de TIC que suportam funções críticas ou importantes que podem ser subcontratados e sob que condições. Caso seja admissível, os contratos celebrados entre a entidade financeira e o terceiro prestador de serviços TIC devem incluir as disposições contratuais que incidam sobre:
- A responsabilidade do terceiro prestador de serviços TIC pelos serviços subcontratados;
- Requisitos para a monitorizar e disponibilizar relatórios nos serviços subcontratados;
- Avaliação de risco das localizações dos subcontratantes e dos dados partilhados (incluindo a Empresa-Mãe);
- Garantia da continuidade dos serviços e compliance com os requisitos de segurança estabelecidos;
- Os direitos de acesso, inspeção e auditoria da entidade financeira quanto aos serviços subcontratados;
- O dever de notificação em casos de alterações materiais aos contratos de subcontratação; e
- Os direitos de rescisão da entidade financeira.
Quaisquer alterações a tais contratos para efeitos de cumprimento do Regulamento DORA devem ser prontamente implementadas e documentadas.
2.5. Requisitos relacionados à cadeia de subcontratação de TIC
O Artigo 5.º dos RTS estabelece requisitos para a subcontratação relacionados com a cadeia dos terceiros fornecedores de serviços de TIC, nomeadamente:
- A identificação de toda a cadeia de subcontratantes de TIC envolvidos na prestação de serviços críticos ou importantes, que deve ser atualizada de forma contínua;
- Que a entidade financeira deve manter a responsabilidade geral pelos serviços de TIC prestados por terceiros prestadores de serviços, o que significa que o contrato deverá permitir a monitorização dos riscos de TIC;
- Que o contrato deve incluir disposições que permitam à entidade financeira avaliar o impacto de uma cadeia de subcontratação potencialmente complexa a sua capacidade de monitorizar funções críticas, assim como a capacidade das autoridades competentes supervisionarem a entidade financeira;
- Direitos da entidade financeira de obter informações do terceiro prestador de serviços TIC sobre os contratos de subcontratação e os indicadores de desempenho relevantes.
2.6. Alterações materiais na subcontratação de serviços críticos de TIC
O Artigo 6.º dos RTS descreve os procedimentos que as entidades financeiras devem seguir caso surjam alterações materiais aos contratos de subcontratação, que consistem em:
- Implementar um procedimento de notificação de quaisquer alterações materiais nos contratos de subcontratação, no qual o período de pré-aviso deve ser extenso o suficiente para que a entidade financeira possa avaliar o impacto de tais alterações na sua exposição ao risco e determinar se o terceiro prestador de serviços de TIC ainda consegue cumprir as suas obrigações contratuais;
- O terceiro prestador de serviços de TIC deverá implementar tais alterações propostas às disposições contratuais apenas após a entidade financeira ter aprovado as alterações ou optado por não se opor às mesmas até ao fim do prazo estabelecido;
- Nos casos em que da avaliação de risco da entidade financeira resultar que tais alterações excedem a sua tolerância ao risco, a mesma deverá agir antes do término do prazo, tomando as seguintes medidas:
- Informar o terceiro prestador de serviços de TIC sobre os resultados obtidos na sua avaliação de risco; e
- Exercer o seu direito de oposição às alterações e solicitar as modificações que entenda necessárias antes da sua implementação.
2.7. Rescisão do contrato de serviços de TIC
O Artigo 7.º dos RTS estabelece as condições em que a entidade financeira tem o direito de rescindir o contrato com o terceiro prestador de serviços de TIC. Tais situações incluem os casos em que terceiro prestador de serviços de TIC:
- Implemente alterações materiais, apesar da objeção da entidade financeira e solicitação de modificações;
- Implemente alterações materiais nos contratos de subcontratação para serviços críticos ou importantes de TIC antes do término do período de notificação e sem a aprovação expressa da entidade financeira; ou
- Subcontrate um serviço de TIC que suporte uma função crítica ou importante que o contrato não permita explicitamente que seja subcontratada.
Próximos passos
Após a adoção dos RTS por parte da Comissão, os mesmos tornar-se-ão obrigatórios e tal exigirá ações por parte das entidades financeiras para garantir conformidade com os mesmos, nomeadamente:
- Revisão contratual: avaliar todos os contratos existentes e em vigor com terceiros prestadores de serviços de TIC de forma a garantir que se encontram em conformidade com estes novos requisitos, incluindo as disposições relacionados com a subcontratação e gestão de riscos.
- Implementação de frameworks de gestão de risco: reforçar os processos internos, incorporando os requisitos de forma a garantir a monitorização contínua dos subcontratantes de serviços de TIC.
- Comunicação com os subcontrantes: informar os subcontratantes de serviços de TIC de forma a garantir que entendem os novos requisitos e as responsabilidades associadas ao cumprimento dos mesmos.
- Auditorias: preparar-se para eventuais auditorias regulatórias através da revisão e atualização de toda a documentação relevante, particularmente os contratos de serviços de TIC.
Considerações finais
A introdução destes RTS que complementam o Regulamento DORA representa um desenvolvimento importante nos esforços da UE para fortalecer a resiliência operacional digital no setor financeiro.
O Regulamento DORA é aplicável a partir de 17 de janeiro de 2025.
Tanto as entidades financeiras quanto os terceiros prestadores de serviços de TIC devem agir rapidamente para, respetivamente, alinharem as suas práticas de subcontratação e se adaptarem a estes novos requisitos, de forma a evitarem o não cumprimento dos mesmos e reforçarem a sua integridade operacional.