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23.08.2024

Legal Alert | Regulamento DORA: novas normas técnicas de regulamentação quanto à subcontratação de serviços de TIC

Legal Alert | Regulamento DORA: novas normas técnicas de regulamentação quanto à subcontratação de serviços de TIC

As Autoridades Europeias de Supervisão divulgaram o Relatório Final sobre as Normas Técnicas de Regulamentação vinculadas ao Regulamento DORA, que tem como objetivo aumentar a resiliência operacional digital do sector financeiro na União Europeia. Estes RTS introduzem novos requisitos rigorosos para a subcontratação de serviços de tecnologias de informação e comunicação, com especial destaque para as funções críticas. As orientações compreendem desde a avaliação dos riscos e de due diligence até a implementação de padrões contratuais e a gestão das cadeias de subcontratação. Para garantir conformidade antes de janeiro de 2025, as instituições financeiras e os seus fornecedores de TIC precisam de adaptar rapidamente as suas práticas de subcontratação.

1. Contexto

As Autoridades Europeias de Supervisão (AES) publicaram recentemente o Relatório Final relativamente aos Projetos de Normas Técnicas de Regulamentação (Regulatory Technical Standards – RTS) conforme exigido pelo Artigo 30.º, n.º5 do Regulamento (EU) 2022/2554 relativo à resiliência operacional digital do setor financeiro (Regulamento DORA). 

Estes RTS estabelecem novos requisitos para as entidades financeiras no que diz respeito à subcontratação de serviços de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), especialmente quanto aos serviços que suportam funções críticas ou importantes, de forma a fortalecer a gestão de risco associado às TIC nestas situações.

De forma alinhada com o Regulamento DORA, os RTS visam reforçar a resiliência digital das entidades financeiras em toda a União Europeia (UE), visando garantir que os riscos associados à subcontratação de serviços de TIC sejam adequadamente geridos e mitigados.

2. Aspetos-chave dos RTS

2.1. Avaliação da subcontratação de TIC

Artigo 1.º dos RTS especifica os elementos que as entidades financeiras devem considerar ao determinar (i) a dimensão, (ii) o perfil de risco, (iii) a natureza, (iv) a escala e  a (v) complexidade dos seus serviços, atividades e operações. Tal inclui a avaliação de fatores como: 

  • O tipo de serviços de TIC que suportam funções críticas ou importantes ao abrigo do contrato celebrado entre a entidade financeira e o terceiro prestador de serviços de TIC e entre este último e os seus subcontratantes;
  • A localização dos subcontratados de TIC e as suas empresas-mãe;
  • A extensão e complexidade da cadeia de subcontratação;
  • A natureza dos dados partilhados com os subcontratantes de TIC e se os serviços de TIC subcontratados são fornecidos dentro da UE ou em países terceiros, incluindo onde os serviços são prestados e onde os dados são objeto de tratamento e conservação;
  • A identificação dos prestadores de serviço TIC intra-grupo e se se encontram registados ou supervisionados por uma autoridade competente de um Estado-Membro da EU ou de um país terceiro; 
  • A avaliação de concentração de serviços de TIC em um ou poucos subcontratantes; 
  • A capacidade de trocar de prestadores de serviço de TIC e o risco de disrupção que afetem serviços críticos de TIC ao utilizar subcontratantes.

2.2. Implementação de standards uniformes para a subcontratação intra-grupo

Artigo 2.º dos RTS estabelece que a empresa-mãe do grupo da entidade financeira deve garantir que os standards se aplicam igualmente aos subcontratantes intra-grupo, o que significa que as entidades dentro do mesmo grupo se encontram sujeitas à mesma supervisão que os terceiros prestadores de serviço, em particular:

  • As entidades financeiras devem assegurar que os prestadores de serviços de TIC intra grupo se encontram sujeitos às mesmas avaliações de risco e monitorização contínua que os terceiros prestadores de serviço; 
  • A empresa-mãe deve implementar práticas de subcontratação consistentes em todas as entidades do grupo, de forma a garantir uma abordagem coesa para a gestão de risco e conformidade. 

2.3. Due diligence e avaliação de risco para funções críticas

De acordo com o Artigo 3.º dos RTS, as entidades financeiras devem aferir, antes de contratar um terceiro prestador de serviços de TIC, se tal prestador de serviços se encontra autorizado ou não a subcontratar total ou parcialmente quaisquer funções críticas, avaliando:

  • Se o terceiro prestador de serviços de TIC implementou um processo de due diligence para verificar as capacidades operacionais e financeiras potenciais dos seus subcontratantes; 
  • Se o terceiro prestador de serviços de TIC tem capacidade para identificar e informar a entidade financeira sobre todos os subcontratantes envolvidos e verificar se os contratos com os mesmos permitem que a entidade financeira cumpra as obrigações legais, tais como direitos de acesso para auditorias e inspeções; 
  • Se o terceiro prestador de serviços de TIC tem recursos, conhecimentos técnicos e estruturas de gestão de riscos adequadas para supervisionar os serviços subcontratados e se a entidade financeira também tem os recursos e estruturas para supervisionar quer o terceiro prestador de serviços TIC como os seus subcontratantes;
  • Os riscos relacionados com a localização dos subcontratantes e a concentração de serviços de TIC (incluindo os riscos de uma eventual falha).

Tal avaliação deve ser realizada periodicamente pelas entidades financeiras.

2.4. Condições para a subcontratação de serviços críticos de TIC

De acordo com o Artigo 4.º dos RTS, as entidades financeiras devem definir claramente quais os serviços de TIC que suportam funções críticas ou importantes que podem ser subcontratados e sob que condições. Caso seja admissível, os contratos celebrados entre a entidade financeira e o terceiro prestador de serviços TIC devem incluir as disposições contratuais que incidam sobre: 

  • A responsabilidade do terceiro prestador de serviços TIC pelos serviços subcontratados; 
  • Requisitos para a monitorizar e disponibilizar relatórios nos serviços subcontratados; 
  • Avaliação de risco das localizações dos subcontratantes e dos dados partilhados (incluindo a Empresa-Mãe); 
  • Garantia da continuidade dos serviços e compliance com os requisitos de segurança estabelecidos; 
  • Os direitos de acesso, inspeção e auditoria da entidade financeira quanto aos serviços subcontratados; 
  • O dever de notificação em casos de alterações materiais aos contratos de subcontratação; e
  • Os direitos de rescisão da entidade financeira. 

Quaisquer alterações a tais contratos para efeitos de cumprimento do Regulamento DORA devem ser prontamente implementadas e documentadas. 

2.5. Requisitos relacionados à cadeia de subcontratação de TIC

Artigo 5.º dos RTS estabelece requisitos para a subcontratação relacionados com a cadeia dos terceiros fornecedores de serviços de TIC, nomeadamente:

  • A identificação de toda a cadeia de subcontratantes de TIC envolvidos na prestação de serviços críticos ou importantes, que deve ser atualizada de forma contínua;
  • Que a entidade financeira deve manter a responsabilidade geral pelos serviços de TIC prestados por terceiros prestadores de serviços, o que significa que o contrato deverá permitir a monitorização dos riscos de TIC;
  • Que o contrato deve incluir disposições que permitam à entidade financeira avaliar o impacto de uma cadeia de subcontratação potencialmente complexa a sua capacidade de monitorizar funções críticas, assim como a capacidade das autoridades competentes supervisionarem a entidade financeira; 
  • Direitos da entidade financeira de obter informações do terceiro prestador de serviços TIC sobre os contratos de subcontratação e os indicadores de desempenho relevantes.

2.6. Alterações materiais na subcontratação de serviços críticos de TIC

Artigo 6.º dos RTS descreve os procedimentos que as entidades financeiras devem seguir caso surjam alterações materiais aos contratos de subcontratação, que consistem em:

  • Implementar um procedimento de notificação de quaisquer alterações materiais nos contratos de subcontratação, no qual o período de pré-aviso deve ser extenso o suficiente para que a entidade financeira possa avaliar o impacto de tais alterações na sua exposição ao risco e determinar se o terceiro prestador de serviços de TIC ainda consegue cumprir as suas obrigações contratuais;
  • O terceiro prestador de serviços de TIC deverá implementar tais alterações propostas às disposições contratuais apenas após a entidade financeira ter aprovado as alterações ou optado por não se opor às mesmas até ao fim do prazo estabelecido;
  • Nos casos em que da avaliação de risco da entidade financeira resultar que tais alterações excedem a sua tolerância ao risco, a mesma deverá agir antes do término do prazo, tomando as seguintes medidas:
    • Informar o terceiro prestador de serviços de TIC sobre os resultados obtidos na sua avaliação de risco; e
    • Exercer o seu direito de oposição às alterações e solicitar as modificações que entenda necessárias antes da sua implementação.

2.7. Rescisão do contrato de serviços de TIC

Artigo 7.º dos RTS estabelece as condições em que a entidade financeira tem o direito de rescindir o contrato com o terceiro prestador de serviços de TIC. Tais situações incluem os casos em que terceiro prestador de serviços de TIC:

  • Implemente alterações materiais, apesar da objeção da entidade financeira e solicitação de modificações; 
  • Implemente alterações materiais nos contratos de subcontratação para serviços críticos ou importantes de TIC antes do término do período de notificação e sem a aprovação expressa da entidade financeira; ou
  • Subcontrate um serviço de TIC que suporte uma função crítica ou importante que o contrato não permita explicitamente que seja subcontratada. 

Próximos passos

Após a adoção dos RTS por parte da Comissão, os mesmos tornar-se-ão obrigatórios e tal exigirá ações por parte das entidades financeiras para garantir conformidade com os mesmos, nomeadamente:

  • Revisão contratual: avaliar todos os contratos existentes e em vigor com terceiros prestadores de serviços de TIC de forma a garantir que se encontram em conformidade com estes novos requisitos, incluindo as disposições relacionados com a subcontratação e gestão de riscos.
  • Implementação de frameworks de gestão de risco: reforçar os processos internos, incorporando os requisitos de forma a garantir a monitorização contínua dos subcontratantes de serviços de TIC.
  • Comunicação com os subcontrantes: informar os subcontratantes de serviços de TIC de forma a garantir que entendem os novos requisitos e as responsabilidades associadas ao cumprimento dos mesmos.
  • Auditorias: preparar-se para eventuais auditorias regulatórias através da revisão e atualização de toda a documentação relevante, particularmente os contratos de serviços de TIC.


Considerações finais

A introdução destes RTS que complementam o Regulamento DORA representa um desenvolvimento importante nos esforços da UE para fortalecer a resiliência operacional digital no setor financeiro.

O Regulamento DORA é aplicável a partir de 17 de janeiro de 2025.

Tanto as entidades financeiras quanto os terceiros prestadores de serviços de TIC devem agir rapidamente para, respetivamente, alinharem as suas práticas de subcontratação e se adaptarem a estes novos requisitos, de forma a evitarem o não cumprimento dos mesmos e reforçarem a sua integridade operacional.

Para maior detalhe sobre como tais alterações podem ter um impacto na sua organização, entre em contacto com a nossa equipa - Nicole Fortunato, Nuno Sobreira, Ashick Hussein Remetula e Márcia Tomás Pires.