Entrou em vigor, no passado dia 15 de outubro, o Decreto-Lei n.º 70/2022, de 14 de outubro (DL 70/2022), que estabelece um conjunto de medidas de garantia da segurança de abastecimento de gás em Portugal, em reforço dos mecanismos de segurança previstos no Decreto-Lei n.º 62/2020 (Diploma que estabelece a organização e o funcionamento do Sistema Nacional de Gás), de 28 de agosto, visando fazer face à instabilidade sentida presentemente no mercado energético e precaver eventos excecionais, capazes de colocar em risco o abastecimento de gás.
O DL 70/2022 aplica-se aos intervenientes do Sistema Nacional de Gás (SNG), prevendo‑se que as medidas extraordinárias nele contidas vigorem pelo prazo de dois anos (arts. 2.º e 16.º | DL 70/2022).
A par da criação da reserva estratégica de gás natural, que complementa a reserva de segurança existente, da titularidade do Estado (art. 11.º | DL 70/2022), o pacote das medidas extraordinárias de garantia da segurança do abastecimento compreende as seguintes:
- Informação referente aos contratos de longo prazo em regime de take or pay (art. 3.º │ DL 70/2022) – reforço das obrigações do comercializador do SNG e do operador do terminal de gás natural liquefeito em matéria de reporte, à Direção-Geral de Energia e Geologia, das previsões de disponibilização e indisponibilidades de gás comunicadas pelo produtor, das quantidades de gás fornecidas e objeto de transbordo, de todas as informações, conhecidas ou previsíveis, relativas a restrições de quantidades, indisponibilidades ou de invocação de casos fortuitos ou de força maior pelo produtor;
- Reservas de segurança adicionais (art. 7.º e 8.º │ DL 70/2022) – em situações de risco de restrição de abastecimento do SNG ou de alerta na União Europeia, de redução continuada de existências na Rede Nacional de Transporte ou de previsibilidade de escassez no mercado ibérico, há a possibilidade de imposição, aos comercializadores em regime de mercado e de último recurso retalhista, de constituição de reservas de segurança adicionais;
- Garantia de abastecimento do SNG (art. 4.º │ DL 70/2022) – em caso de escassez de gás, os comercializadores do SNG devem dar preferência ao abastecimento dos “clientes protegidos” (i.e, clientes domésticos e pequenas e médias empresas e serviços sociais essenciais, desde que estes últimos não representem, em conjunto, mais de 20% do consumo total anual de gás, conforme art. 98.º do Decreto-Lei n.º 62/2020, de 28 de agosto). O comercializador do SNG deve, por sua vez, garantir que o gás oriundo dos contratos de take or pay é alocado pela seguinte ordem de preferência: (i) comercializador de último recurso grossista; (ii) centros electroprodutores com contrato de fornecimento outorgado em data anterior a 27 de julho de 2006; e (iii) clientes do SNG com quem tenham contrato; prevê-se, adicionalmente, que, em caso de não disponibilização do gás pelo produtor, o comercializador do SNG possa procurar as melhores alternativas para garantir o abastecimento;
- Operador dominante no SNG (arts. 5.º e 6.º │ DL 70/2022) – atribuição da condição de “operador dominante do SNG” à entidade que, direta ou indiretamente, detenha uma quota de mercado, em volume ou em número de clientes, superior a 20% (em termos de gás natural nomeado nas entradas do SNG e/ou em termos de gás natural comercializado a clientes finais), podendo ser imposto às entidades que detenham tal qualidade que: (i) apresentem ofertas de compra e venda de gás em mercado organizado; (ii) cedam capacidade de aprovisionamento ao SNG; e (iii) diversifiquem as origens do aprovisionamento. São elegíveis para a condição de operador dominante do SNG (art. 5.º │ DL 70/2022): (i) o comercializador do SNG; (ii) o comercializador de último recurso grossista no SNG; (iii) os comercializadores e agentes de mercado a atuar no SNG; (iv) os consumidores de gás natural que assegurem diretamente o seu aprovisionamento de gás no âmbito do mercado grossista de gás natural; e (v) as instalações de cogeração que produzem energia elétrica e que utilizam gás natural como energia primária;
- Sistema de disponibilização e mobilização de excedentes de gás natural / SDEGN (arts. 9.º e 10.º │ DL 70/2022) – criação de um mecanismo competitivo, destinado a permitir a colocação em mercado de excedentes de gás gerados por situação de redução da procura por parte de grandes consumidores finais (i.e, consumidores de gás no território nacional, com consumos superiores a 1 milhão de m3/ano), podendo o gestor técnico global do sistema, em caso de falha de abastecimento, redirecionar o gás natural disponibilizado no SDEGN para os clientes dos comercializadores em incumprimento.
A violação do DL n.º 70/2022 constitui contraordenação, punível nos termos do Regime Sancionatório do Setor Energético.
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