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31.01.2017

O que é nacional (e não afete o comércio transfronteiriço) é bom: Comissão Europeia publica decisões relativas a medidas locais de apoio público que não constituem auxílios de Estado

Sempre que um Estado-Membro concede uma vantagem patrimonial, independentemente da forma que assuma, que favoreça certas empresas, setores ou atividades, deve notificar essa ajuda de Estado à Comissão Europeia, quando a mesma distorça a concorrência no mercado e afete o comércio transfronteiriço. As ajudas de Estado são consideradas ilegais à luz do Tratado de Funcionamento da União Europeia, podendo, contudo, ser aprovadas pela Comissão em determinadas circunstâncias, após terem sido notificadas pelo respetivo Estado-Membro.

No âmbito desses poderes, a Comissão Europeia anunciou a conclusão de cinco processos de avaliação da compatibilidade de medidas locais de apoio público em Espanha, Alemanha e Portugal com as regras de auxílios de Estado da União (doravante, as “decisões”).

Na decisão relativa à ajuda concedida pelo Estado Português1, estava em causa uma subvenção de 80% dos custos elegíveis de um projeto para a construção de residências assistidas para idosos, com capacidade total de 60 camas, pela Santa Casa da Misericórdia de Tomar.

Nas decisões sobre as ajudas concedidas pelo Estado espanhol, a Comissão analisou duas medidas de apoio a línguas regionais – o Basco e o Valenciano2. Em ambos os casos, o Estado espanhol pretendia conceder apoios financeiros a meios de comunicação locais que utilizassem as respetivas línguas nas suas publicações.

Já as ajudas concedidas pelo Estado alemão3 prendiam-se com apoios financeiros:

(i) à construção de diversas instalações desportivas no complexo “Sportcamp Nordbayern”, na região da Baviera, que se destinavam a ser utilizadas essencialmente por escolas, clubes desportivos sem fins lucrativos e atividades sociais ou pedagógicas e
(ii) à renovação e modernização das infraestruturas no porto da ilha Föhr (com apenas 8.000 habitantes) que é utilizado quase exclusivamente para o aprovisionamento da mesma através de um serviço de ferries a partir do território continental alemão, durante todo o ano.

As decisões vêm confirmar que um Estado-Membro pode aplicar, sem controlo prévio da Comissão, determinadas medidas de apoio público, na medida em que as mesmas não afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros. Estas decisões vêm na sequência de um conjunto de sete casos publicados em 2015 em que a Comissão deu indicações sobre que medidas de apoio público de carácter local não necessitariam de notificação prévia à Comissão Europeia.

Nas suas orientações sobre a noção de auxílio de Estado, de maio de 2016, a Comissão tinha já referido que não se pode considerar que uma ajuda tenha efeitos no comércio transfronteiriço quando:

  • A mesma apenas tem impacto numa área limitada no interior de um Estado-Membro;
  • Não é suscetível de atrair clientes provenientes de outros Estados-Membros; e
  • Não se pode prever que a medida teria um efeito mais que marginal sobre as condições dos investimentos ou do estabelecimento transfronteiriços.

Nas decisões mencionadas, a Comissão começou por referir que, se por um lado, não tem que demonstrar os efeitos reais desses auxílios sobre a concorrência e sobre as trocas comerciais, por outro esse efeito não pode ser meramente hipotético ou presumido. É necessário, por isso, efetuar uma análise dos efeitos previsíveis e concretos da medida no comércio transfronteiriço.

Nas análises que efetuou às medidas supra descritas, a Comissão apontou vários fatores que contribuíram para a conclusão que os efeitos sobre as trocas comerciais intra-União são marginais, entre eles:

  • Os serviços prestados pelas entidades em causa eram de natureza meramente local e só se encontravam disponíveis numa zona geográfica restrita;
  • O número de beneficiários era limitado;
  • Os serviços prestados não apresentavam uma particular atratividade para cidadãos de outros Estados-Membros;
  • Os serviços eram prestados nas línguas locais e as comunicações dos operadores em causa tinham apenas dimensão local;
  • Não foram apresentadas provas de anteriores investimentos por operadores de outros Estados-Membros; e
  • Os serviços apresentavam baixa rentabilidade (o que tornava improvável que estas atividades pudessem atrair investimentos significativos provenientes de outros Estados-Membros).

Esta posição da Comissão aumenta a segurança jurídica dos Estados e operadores económicos nesta matéria, reduzindo os recursos necessários para a implementação deste tipo de apoios e o trabalho burocrático para aprovação dos mesmos, dada a perspetiva mais estrita adotada relativamente ao conceito de afetação do comércio intracomunitário. Contudo, esta terá ainda que ser confirmada pelos Tribunais Europeus, cuja prática decisória tem seguido uma interpretação mais ampla deste conceito. A decisão relativa ao alegado auxílio estatal à SCMT encontra-se em recurso junto do TGUE, pelo que este promete ser um importante julgamento nesta área.

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1 Vd. Caso SA.38920, Alegado auxílio estatal à Santa Casa da Misericórdia de Tomar (SCMT), de 9 de agosto de 2016.
2 Vd. Caso SA.45512, Alegado auxílio estatal para promoção do Valenciano nos media, de 1 de agosto de 2016 e Caso SA.44942, Alegado auxílio estatal aos media locais de língua Basca, de 4 de agosto de 2016.
3 Vd. Caso SA.44692, Alegado auxílio estatal ao investimento no Porto de Föhr, de 20 de julho de 2016 e Caso SA. 43983, Alegado auxílio estatal ao BLSV Sportcamp Nordbayern, de 9 de agosto de 2016.