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30.12.2014

TEDH determina que a realização de buscas e a apreensão de documentos nas instalações de uma empresa por uma AC estão sujeitas a controlo prévio das autoridades judiciárias

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, no caso Delta Pekárny a.s. c. República Checa, queixa n.° 97/11, por acórdão de 2 de outubro de 20141, constatou a violação pela República Checa do artigo 8.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), referente ao respeito da vida privada e familiar, domicílio e correspondência2.

A empresa queixosa perante o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Delta Pekárny a.s., é uma sociedade de responsabilidade limitada ao abrigo da lei Checa com sede social em Brno (na República Checa).

O caso analisado pelo Tribunal de Estrasburgo tem por base uma inspeção efetuada nas instalações da referida empresa em 19 de novembro de 2013, no âmbito de um inquérito contraordenacional jusconcorrencial desencadeado pela Autoridade da Concorrência Checa (ACC) nessa mesma data e que tinha por objeto a alegada violação das normas aplicáveis a práticas restritivas da concorrência pela empresa. Nos termos do relatório de inspeção realizado pela ACC os fundamentos e o objetivo da busca conduzida nas instalações da empresa reduziam-se a examinar e apreender documentação no âmbito do referido procedimento administrativo. Durante a inspeção os funcionários da ACC tiveram acesso a correspondência dos representantes legais da empresa e ainda, de acordo com o relatório, bem como a cópias de diversos documentos. A empresa foi, não obstante, cumulativamente sancionada pela ACC por se ter recusado a autorizar uma análise detalhada da sua documentação comercial. Neste contexto, a Delta Pekárny a.s. impugnou judicialmente a decisão da ACC, sustentando, entre o mais, que a realização da inspeção pela ACC sem prévia autorização de uma autoridade judiciária infringia a lei nacional e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Todos os recursos apresentados pela empresa junto dos órgãos da judicatura, incluindo um recurso junto do tribunal constitucional checo no ano de 2009, foram considerados improcedentes.

No processo junto do Tribunal Europeu dos Direito do Homem foi sustentado pela empresa, em particular, que a inspeção efetuada às suas instalações, sem qualquer tipo de validação ex ante por uma autoridade judiciária, configurava uma violação dos seus direitos, tal como reconhecido no artigo 8.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Neste domínio, o Governo Checo argumentou, no procedimento que correu termos junto do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que a legislação interna permitia que a inspeção fosse efetuada sem qualquer prévia autorização judiciária e que a ACC acedesse e analisasse os documentos da empresa (estabelecendo indiretamente um paralelismo com o artigo 20.° do Regulamento (CE) n.° 1/20033, relativo aos poderes da Comissão Europeia no âmbito de inspeções a empresas).

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem estabelece, no acórdão de outubro de 2014, que face à ausência de prévia autorização de uma autoridade judiciária para a condução do ato inspetivo da ACC e dada essa carência de um controlo judiciário efetivo sobre a proporcionalidade e necessidade do ato inspetivo, não estavam reunidas garantias adequadas contra a potencial arbitrariedade das medidas adotadas – levando a que a referida interferência administrativa pela ACC na empresa queixosa fosse considerada desproporcional vis-à-vis os objetivos de interesse público prosseguidos (defesa e promoção da concorrência). Nestes termos, o Tribunal constatou e declarou que a República Checa infringiu o artigo 8.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Este acórdão é particularmente relevante dado que sinaliza, ainda que indiretamente, que o Regulamento (CE) n.° 1/2003, maxime o respetivo artigo 20.°, que confere poderes à Comissão Europeia para efetuar inspeções nas instalações das empresas sem prévio controlo das autoridades judiciárias, pode ser considerado incompatível com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Ademais, e desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, que estabelece no artigo 6.° que os Direitos Fundamentais, conforme garantidos pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem, constituem princípios gerais do direito da União Europeia, o artigo 20.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003, poderá ter de ser alterado pela legislatura Europeia, passando de jure a prever um controlo ex ante das autoridades judiciárias sobre as inspeções a realizar pela Comissão Europeia.

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1 Disponível e acedido em http://www.echr.coe.int/Pages/home.aspx?p=home&c=.
2 O artigo 8.° da CEDH, sob a epígrafe “Direito ao respeito pela vida privada e familiar”, dispõe: “1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência. 2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem - estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infrações penais, a proteção da saúde ou da moral, ou a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros.”
3 Regulamento (CE) n.° 1/2003, do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos atuais artigos 101.° e 102.° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.